segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Umberto Eco



Tenho tentado manter alguma regularidade, uma ou duas postagens a cada quatro ou cinco anos. Ou talvez eu devesse repostar o que postado já foi. Por aqui, quase nada envelhece. Na foto, o escritor Umberto Eco com paletó de anarruga. 

 

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

O fim de uma era. O reinício de outra.



Mal me dei conta: foram cinco anos sem postar. Exatamente cinco anos sem aparecer por aqui. Nesse meio tempo tanta coisa mudou, se bem que nem tudo para melhor. A Casa Moreira, por exemplo, fechou. 

Eu não andava pelo Centro do Rio já fazia algum tempo e me ocorreu então planejar a próxima encomenda, um par de sapatos que jamais saiu do papel. Seria novamente, já quase pela décima vez, um Oxford, full brogue - cor do couro a combinar. Mas agora, só em Buenos Aires de novo. Nossos vizinhos têm bons escritores, empanadas, Malbec, e sapatos melhores também. 

Em cinco anos muita coisa muda, cadarços que arrebentam, algumas solas se trocam, mas os sapatos permanecem. Só parecem agora um pouco mais cansados de tanto caminhar. Na foto, órfãos da Casa Moreira.

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Casa Moreira: calçados sob medida feitos à mão


A Travessa do Ouvidor é uma daquelas ruelas para pedestres escondidas no Centro do Rio de Janeiro. É impossível ignorar por ali a presença de Pixinguinha reproduzido em bronze e armado de um potente saxofone. Menos visível, porém, é a loja reclusa no fundo de um estreito corredor que desemboca na mesma viela. Uma placa esculpida em madeira, pendurada sem alarde no interior da loja, explica aos desavisados: "Calçados sob medida feitos à mão."

Marcelo no comando da Casa Moreira

A Casa Moreira é uma dessas instituições cariocas que se confundem com a história da cidade. Ela dispensa propagandas em jornais ou revistas, pois tem a seu favor mais de setenta anos de tradição e uma legião de clientes. Ela é uma das únicas, talvez a última sapataria da cidade dedicada à confecção de sapatos sob medida de alta qualidade, inteiramente feitos à mão, claro. Cada par é confeccionado para um cliente específico. 

Marcelo, à frente do negócio, mede pé esquerdo e pé direito separadamente, pelo menos duas vezes para não haver erros. Ele risca o contorno da silhueta da planta dos pés sobre uma folha de papel A4. Mais tarde, com base nas medidas tiradas na loja, cada cliente terá eternizada em madeira a "estátua" dos pés, mais conhecida como "forma de sapateiro". A forma é como um cadastro em três dimensões para cada cliente. Uma vez confeccionada e ajustada, ela será a mesma, por anos a fio, independentemente do modelo escolhido pelo cliente em cada nova visita à loja. As formas de madeira são para a sapataria o que os moldes em papel são para a alfaiataria.


A Casa Moreira foi fundada em 1939, no mesmo ano, aliás, em que Pixinguinha adotou para si o imponente saxofone que o acompanharia pelo resto de suas composições. O endereço? Travessa do Ouvidor, 8, sala 101. Telefone: 21 2224-9419.

domingo, 11 de agosto de 2013

Sapatos para usar em casa (IV)

típico morador de Roma em sua residência

Há quem os prefira simples e discretos, adaptados à cor do assoalho; outros os preferem menos anônimos, gravados com as iniciais. Sapatos para usar em casa são um exercício de criatividade e imaginação. Algumas pessoas em Roma, como o senhor da foto que preferiu não se identificar, teve seus sapatos confeccionados em cor vibrante para receber com espiritualidade uma legião de amigos fieis em sua residência na Praça São Pedro. 


tante grazie...

Se você tiver sorte - e alguma influência - é até mesmo possível que alguns amigos lhe presenteiem com os melhores sapatos que as mãos humanas são capazes de fabricar. Adriano Stefanelli exerce seu ofício desde os 14 anos de idade. Na foto, Stefanelli, em um autêntico gesto de caridade cristã, oferece ao ancião que passeava despreocupado pelas ruas de Roma uma amostra de sua arte. 

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Sapatos para usar em casa (III)

sapatos leiloados em 2011

Douglas Fairbanks (o filho) atuou em vários filmes antes da Segunda Grande Guerra, e mesmo depois. A elegância com que se vestia era notória. Ele faleceu em 2000, aos noventa anos. No ano seguinte, uma vasta coleção de itens de seu guarda-roupa foi a leilão. Quem deu o lance mais alto pelo par de sapatos para usar em casas com monogramas, da foto acima, ninguém sabe ao certo. Mas o felizardo levou para casa, com certeza, um pedaço da história da indumentária no século XX.

Henry Maxwell, fundada em 1750

Os sapatos foram feitos por um outro ícone da sapataria masculina, a Henry Maxwell,  fundada em 1750, em Londres, e ainda hoje existente. A firma foi incorporada à Foster & Son em 1999, mas o endereço nos sapatos de Fairbanks  são da época em que a firma ainda atuava na Dover Street.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Sapatos para usar em casa (II)

contracapa de Churchill Style, de Barry Singer

Deve haver algo de mais interessante em um livro do que a reprodução de sua contracapa, mas é isso o que eu gostaria de mostrar a título de complemento à postagem anterior. A contracapa do livro Churchill Style: The Art of Being Winston Churchill (2012), de Barry Singer, mostra um par de slippers, ou sapatos para usar em casa, com as iniciais do famoso estadista britânico. Churchill, como se sabe, venceu muitas batalhas, perdeu algumas, mas em seu estilo ele era único e imbatível. 

O par de sapatos da contracapa foi feito - sob encomenda, claro - pelo lendário sapateiro Nikolau Tuczek, em 1950. Vejam que é importante não usar falsos eufemismos aqui: Tuczek não era um designer, mas um profissional que fez de seu ofício uma arte. Designers são uma classe inferior e bem mais recente. Eles escondem a falta de talento e os anos de experiência que lhes faltam sob a fachada de um neologismo reproduzido todos os dias em um sem número de revistas e entrevistas. Mas este blog não é sobre designers, fiquem sabendo, mas sobre alfaiates, sapateiros, camiseiros, chapeleiros e artistas, quase sempre anônimos, da elegância clássica masculina. 

A firma de Tuczek foi incorporada à não menos lendária Lobb em 1970. Mas as criações de Tuczek são, ainda hoje, disputadas em leilões na internet. Os livros de registros de sua firma poderiam talvez ser lidos como um capítulo à parte na história do século XX, pois o patronato de Churchill aparece junto ao de outros monumentos de uma era. Não deve ser por acaso, inclusive, que os livros de registros de Tuczek  foram mais tardes incorporados ao National Archives da Inglaterra. 

Sapatos para se usar em casa, como se vê, fazem parte da história de uma época.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Sapatos para usar em casa (I)

sapatos para usar em casa, e somente em casa

Na postagem anterior, eles apareciam refletidos no espelho da loja em que foram encomendados. No início do ano, fora do país, e agora com temperaturas mais baixas na Serra de Petrópolis, eles têm prestado um grande serviço. Sapatos para se usar em casa, e somente em casa, são daqueles artigos que aliam elegância à satisfação de estar em casa. Mas eles já foram mais populares.


capa de Evening Post, por Norman Rockwell em 1959

Havia  aqueles, como os de Winston Churchill e Douglas Fairbanks, com iniciais gravadas sobre a ponta; ou alguns mais discretos, como os que aparecem em uma conhecida ilustração de Norman Rockwell para a capa da revista americana Evening Post, de 1959. O conforto e casualidade que os sapatos da ilustração evocam são indissociáveis da imagem do jornal de domingo espalhado pelo chão, da xícara de chá que se bebe aos poucos, ou do cigarro que se esquece no dedo enquanto o mundo ao redor segue seu curso.

Sapatos para se usar em casa, como os da foto acima, não são mais baratos do que aqueles que você encomendaria para algum casamento. Contudo, longe do suor e poeira, e protegidos da batalha urbana de todos os dias, eles podem muito bem lhe prestar o mesmo serviço por anos a fio, e talvez durar até mais do que qualquer casamento.

domingo, 26 de maio de 2013

Contraforte danificada

seis pares da última autêntica sapataria do Rio de Janeiro

O objetivo era apenas ilustrar neste blog o estrago na contraforte. Vocês devem se lembrar: a contraforte é aquela parte de trás do sapato sobre a qual se desliza o calcanhar. Sem o uso regular da calçadeira, a contraforte tende a ser pressionada, amassada, e gradualmente danificada ao calçarmos os sapatos. Mas a foto que tirei acabou revelando mais do que o infortúnio nos calçados de algum incauto cliente.

O espelho na lateral do balcão flagrou o inesperado. Eu havia acabado de experimentar um par de sapatos que encomendara para usar em casa. O couro na cor ferrugem quase se confunde com o verniz do piso de madeira que tenho na sala. O estalo que eles fazem contra o piso é prova de que também com os ouvidos se apreciam bons sapatos. A sapataria em que foram criados é a melhor, talvez a última para encomenda de autênticos sapatos sob medida no Rio de Janeiro. 

No final das contas, sem querer, a foto registrou seis gêmeos da melhor sapataria da cidade. - Só é preciso agora não esqueçer a calçadeira!

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Bacalhau, Weejuns, e Loafer

norwegians ou simplesmente weejuns

Era um almoço para celebrar um contrato com empresas escandinavas. Um dos brasileiros presentes ficou surpreso, talvez desapontado, ao saber que o bacalhau, ao contrário do que imaginava, está longe de ser o prato nacional da Noruega. Além do bacalhau porém, outro norueguês bastante difundido na cultura popular são esses sapatos informais, parecidos com mocassins. Fora da temporada de pesca, redes e traineiras costumavam dar lugar à construção de sapatos bastante informais e confortáveis. Como esses calçados feitos por pescadores noruegueses em suas horas de folga foram parar em Londres na década de trinta, isso ninguém sabe ao certo. Mas eles rapidamente caíram no gosto de americanos de férias pela Europa. Não por acaso, eles passaram então a ser conhecidos em inglês como norwegians: "noruegueses". Esse foi também o início de uma confusão, pois há dois tipos de sapatos que podem ser denominados "noruegueses", um com cadarços; o outro, sem. 

Loafers ou Penny Loafers

A versão do "norueguês" com cadarços foi o tema da postagem anterior. Trata-se de um sapato bastante popular, se bem que sua combinação com terno e gravata possa despertar a reprovação de muita gente. O norueguês sem cadarços é ainda mais informal. Inicialmente ele era conhecido como "weejuns", uma corruptela de norwegians. Em 1936 o nome Weejuns tornou-se marca registrada da firma americana Bass. Mais tarde, porém, o norueguês passou a ser cada vez mais conhecido como Loafers, ou Penny Loafers, graças ao costume, difundido entre universitários americanos, de inserir a moeda de um penny no losango decorativo da parte superior do sapato.

Resta saber agora se norueguês, apesar do nome, é tão popular em seu país de origem quanto o bacalhau.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Derby ou Norueguês?

"norueguês" da marca Allen Edmonds 
Não deixa de ser um derby, pois ele tem as duas abas laterais típicas do derby, mas o "norwegian", como é conhecido em inglês, tem uma característica bastante peculiar em seu modo de construção. A gáspea, que é a parte superior do sapato, é costurada à lateral, formando uma espécie de faixa em torno do sapato. O "norwegian" é um sapato bastante popular e informal. Mas ele não costuma se decorado com "brogues", aqueles furinhos frequentemente adicionados ao oxford e ao derby. 
 

"norueguês" feito sob medida pelo lendário Lee Kee, em Hong Kong

O "norwegian" é uma espécie de meio termo entre o mocassim e o derby convencional, daí o caráter bastante casual desse modelo. O mocassim também tem a lateral costurada à gaspea, mas não tem cadarços. Um outro sapato que é descendente direto do mocassim, e que também é fabricado sem cadarços, é o "loafer", sobre o qual falarei em breve. Algumas revista brasileiras chamam o "norwegian" de "sapato de bico quebrado". Que falta de imaginação! Trata-se, como ele é conhecido em alemão, inglês e francês de um autêntico "norueguês".